quarta-feira, 14 de setembro de 2011

O medo

A Loira do Banheiro é um problema.
De todas as escolas que já visitei, com todos os alunos de cada uma que já conversei, a única reclamação que recebi foi de uma mãe, por intermédio da coordenação de uma escola, alguns anos atrás, dizendo que sua filha havia chorado por causa da Loira e que ela não tinha gostado de a pequena ter lido o livro.

Muito chato. Eu mesma nunca queria que algo que eu tivesse escrito passasse alguma sensação ruim a alguma criança, por mais cuidado que eu tenha em adaptar e amenizar as informações mais pesadinhas do folclore. Mas eu me pergunto: como é possível que, entre todas as outras crianças, a Loira seja campeã de popularidade? Com ou sem medo, as crianças são loucas por ela - assim como eu fui quando criança.

Na verdade, eu mesma aproveitei a onda da lenda da Loira do Banheiro para assustar as outras meninas da minha turma. Eu tinha medo de entrar no banheiro, que ficava isoladão no pátio, mas resolvi contornar o medo justamente gritando pras outras meninas que eu tinha visto a Loira. Todas nós saímos correndo e rindo, é claro. Coisa de criança. Mas acho interessante, sim, refletir sobre a questão do medo.

No meu ponto de vista, um pouquinho de medo é saudável. O medo tem a função de alerta, cuidado. O meu primeiro livro preferido, como costumo dizer, foi "Os fantasmas da casa mal-assombrada", de Carlos de Marigny. Depois li mais algumas coisas do gênero e cheguei a Edgar Allan Poe. Aí vi que peguei pesado e acabei deixando de lado e mudando o foco rs Mas é natural a fase de curiosidade com os temas de fantasmas, monstros, bruxas, aliens. Na adolescência, então, é o auge - o que explica o sucesso de bilheteria no cinema com filmes trash de terror.

A questão é que, quando o medo ultrapassa o nível de "normalidade", tornando-se um problema para a criança, é importante conversar e tratar disso com tranquilidade. Um livro pode ser um instrumento fantástico para a mãe ou o pai trabalharem as emoções da criança. Há várias publicações no mercado que tratam do tema para crianças. Uma delas, "Quem tem medo de escuro?", da Caramelo, eu mesma traduzi, e é de uma sensibilidade incrível, e há também o "Estou com medo" da mesma editora. Os dois estão fora de catálogo, mas podem ser encontrados em sebos e no site Estante Virtual. A Scipione também tem uma coleção chamada "Quem tem medo", com vários temas, assim como outras editoras. Caso o medo intenso persista, talvez seja o caso de buscar uma terapia, pois ele pode ser o reflexo de algum outro tipo de problema que esteja provocando essa insegurança.

A orientação que eu sigo, como escritora, é ter uma base média: usar o bom senso para não tornar as histórias assustadoras demais nem bobinhas. Se apenas uma ou outra criança se sente desconfortável, trata-se da sensibilidade específica dessas crianças, e isso certamente não acontecerá apenas com uma história, mas se refletirá em diversos outros contextos. Daí a importância de cuidar disso.

Eu mesma sou um ótimo exemplo de medrosa. Eu colecionava e lia tanta coisa sobre extraterrestres na minha infância que comecei, durante uma época, a ficar com medo de madrugada, e tinha pesadelos recorrentes com o tema. Na fase adulta, tive alguns períodos de síndrome do pânico, embora, pelas informações que tenho, eu acredite que se trate muito mais de um desgaste físico causado por excesso de ansiedade e preocupação do que por medo em si. Mas não deixa de ser um sintoma relacionado. Nós, adultos, temos muitos medos, e mais graves do que o das crianças - não na intensidade, mas na realidade. O medo do afastamento das pessoas queridas é maior de todos na grande maioria dos casos.

O importante, para lidar com o medo, no caso de qualquer um - adulto, criança, idoso -, é cuidar-se, informar-se, e combatê-lo com perspectivas positivas da realidade, porque, em geral, o medo é fruto de uma visão puramente negativa dos fatos. Não estou fazendo autoajuda barata rs Eu realmente me informo e procuro entender bastante a área de estudos psicológicos para fazer um trabalho responsável como escritora e educadora, na medida que as duas coisas se misturam. Por isso, meu conselho aos pais é sempre conversar, utilizando essa abordagem. A criança tem medos próprios da idade: de largar a chupeta, do escuro, da escola, etc. Mas, com suporte e amor, ela os enfrentará normalmente, como qualquer outra criança, e se tornará uma pessoinha mais fortalecida em seu desenvolvimento.

2 comentários:

  1. Tanto para as crianças, adolescentes e adultos, as mudanças , crescimentos e responsabilidades geram os medos. E perfeitamente abordado por você, ele se torna negativo ou positivo, dependendo de como você o encara: Com perspectiva boas ou ruins.

    O Medo existe para diferenciarmos a realidade das loucuras! (By Alex..rs)

    Beijos Lua!!!

    Obs: Pronto, gostei!

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  2. "Se apenas uma ou outra criança se sente desconfortável, trata-se da sensibilidade específica dessas crianças, e isso certamente não acontecerá apenas com uma história, mas se refletirá em diversos outros contextos."

    É isso aí. Se a menina teve medo da Loira a partir do seu livro, honestamente, não acho que seja culpa sua; impressiona-me que ela não tenha ouvido falar dessa lenda antes de ler o livro, já que a Loira parece persistir assombrando os banheiros de todas as gerações.

    Eu mesma ouvia essa história quando era menininha. Aparentemente, toda escola tinha uma estudante loira que tinha morrido no banheiro... Minhas colegas morriam de medo dela, e eu, que já era uma cética chata (rs!), fazia questão de entrar no banheiro e seguir as "instruções" clássicas para conjurar a loiraça fantasma: dar a descarga três vezes, gritar três palavrões, bobagens do tipo... Ou seja, eu não acreditava e não tinha medo. Muitas pessoas tinham. O medo de cada um diz mais sobre a pessoa que o experimenta do que sobre a suposta "fonte" desse medo. Se passa do limite, é caso pra terapia, sim.

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